Uma curiosidade
quase mórbida toma conta de mim toda manhã. Aproximo-me da banca de revistas e
escaneio furtivamente as manchetes dos jornais como quem olha um acidente
procurando corpos. Sei que boa coisa não iria ler, mesmo assim insisto na
leitura, querendo saber o que esta ocorrendo de podre no reino tupiniquim;
sabendo também que o efeito daquela noticia será similar à imagem de um corpo
acidentado num desastre imbecil que poderia ter sido evitado por um drink a
menos.
O anjinho e o
diabinho brigam por essa decisão matinal que terá efeito pelo resto do meu dia,
mas acabo dando ouvidos à curiosidade e mando para o inferno a precaução, o
discernimento em saber que ler tudo aquilo não me ajudará em nada, pelo
contrário, dependendo da noticia, ficarei o resto do dia comentando-a com os
colegas, disseminando minha insatisfação com o mundo e distorcendo ainda mais o
que li para convencer-los que o mundo está, estava e sempre estará à beira de
um colapso.
- Bom dia, Frank! –
diria alguém no escritório.
- Bom dia Fulano. – eu responderia, para em seguida comentar: Você viu que soltaram a assassina... Você ouviu a última de Brasília...
Se toda essa
corrupção e violência que pinga dos jornais e revistas me embrulham o estômago,
isso deve ser um bom sinal: devo estar mesmo no caminho menos egoísta; onde se
não consigo evitar as besteiras que faço pelo menos esses atos medonhos do meu
dia-a-dia não prejudicam tanto as pessoas ao meu redor. Contudo, meus
comentários sobre o que leio nos jornais e absorvo pela TV, distorcidos pelo
meu ponto de vista, ajudam ainda mais a propagar essa sensação de indignação
que deveria deixar de ser teoria e obra prima para as minhas lamentações e
passar a prática através do ato de votar em um candidato decente ou no drinque
que deixaria de tomar, por saber que cada gesto meu, por menor que seja, acaba
afetando a todos.
Se não consigo
evitar essa “curiosidade” todo dia, ao menos estou tentando evitar o comentário
inútil sobre esses assuntos desagradáveis de manchetes de jornais e que dão
audiência aos tele noticiários e viram comida para os urubus de plantão. Nem
sempre consigo. Ninguém quer saber se a sua sobrinha começou a andar ou se as
pessoas finalmente pararam de passar fome no Sudão. Notícias boas não dão mesmo
audiência, ibope e nem atenção. No fundo gostamos de ler e comentar sobre a
desgraça alheia para nos dar conta o quanto a nossa vida é “maravilhosa e
perfeita”. Precisamos dos políticos corruptos para que possamos declarar aos
quatro cantos o quanto somos honestos, mesmo comprando produtos piratas que
financiam essa mesma corrupção que tanto nos embrulha o estomago, mesmo
sonegando impostos e etc. Como diria a sabedoria popular: apontar um dedo para
o outro é apontar ao mesmo tempo três outros para nós.
Se alguém está
fazendo algo que é o oposto que faríamos, precisamos pagar o preço de enxergar
o reflexo desse espelho que é o rosto do outro. Não podemos exigir que esse
reflexo se torne semelhante e nem muito menos julgar os seus atos com os
nossos, como se fossemos o único modelo perfeito. Todos nós somos iguais (se
acreditamos que fomos feitos à imagem e à semelhança de um Criador que não tem
rosto e tem todos ao mesmo tempo), mas o nosso ego não. A imperfeição que gera
essa distorção na imagem do espelho é a melhor prova que temos de que cada um
de nós precisa trabalhar a sua imagem (o ego) de acordo com aquilo que
precisamos experimentar para evoluirmos e nos tornarmos pessoas melhores nesse
planeta.
Se você odeia
morango, não posso forçá-lo a gostar por mais que acredite que essa fruta é a
mais nutritiva e a mais saborosa. Se você vier a gostar de morango algum dia,
será por conta própria, por meio das suas próprias escolhas e mesmo gostando
das mesmas coisas, a experiência é diferente para cada um de nós.
Por isso que um certo Rabi á 2000 anos atrás dizia que o maior mandamento que existe é “amais uns aos Outros” e não sei quanto a vocês, mas acredito que se há uma lista de sinônimos que ajude a descrever o amor, “Respeito” está no topo dela. Contudo, respeito pela mulher que te colocou no mundo não é o mesmo que submissão; respeito pela pessoa amada não significa escravidão; respeito pelo teu próximo não é ser um poço de reclamação; respeito por si mesmo não é chafurdar no lixo alheio para perceber o quanto o seu quintal é mais verde e nem tão pouco apontar a sujeira ou o mau cheiro. Pense a respeito, talvez o quintal do outro esteja sujo só para te mostrar o que o seu quintal pode se tornar se você parar de limpar.
Frank Oliveira
- Frank Oliveira é o pseudônimo de Francisco de Oliveira, outros textos podem ser acessados em seu blog: www.cronicasdofrank.blogspot.com
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